Resenha

No Dia de Homenagem aos Campeões de prêmio de uma indústria de máquinas agrícolas, os tradicionais vencedores caem para o segundo lugar. A nova equipe campeã superou todas as outras pela pontuação em autodisciplina. Estranho, porque era a equipe menos disciplinada da empresa. Descobriu-se depois que se superaram graças à “autodisciplina terceirizada”. No princípio, todos acham que a expressão não tem sentido.
A equipe que perdeu o primeiro lugar é formada por três cinquentões, amigos desde a infância. Quando crianças, nadavam na Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte (MG), nos anos 1960. Em 1972, passam a procurar namoradas nas noites de final de semana no centro da capital mineira. Apaixonam-se e cada um tem um destino inesperado. A história é narrada no presente, intercalada com capítulos que esclarecem o passado de mistérios e segredos da vida de Lourival. É um homem capaz de ouvir o lamento das máquinas e o zumbido dos fios elétricos estressados, arte que aprendeu com o Velho Bruxo.
Conhecido como menino-peixe e príncipe das águas quando criança, Lourival, aos 57 anos, está obeso, correndo risco de morrer. Além disso, sonha com frequência que é o cavalo de D. Pedro, no quadro “Independência ou Morte!”, do Museu Paulista. No lugar D. Pedro, sonha que está seu próprio filho, que também se chama Pedro, gritando a frase histórica (ilustração). Decifrar este enigma é uma preocupação do mecânico filósofo Manoel (53).
Trinta e sete anos atrás, o tímido e rústico Lourival conheceu a inteligente e bela Patrícia, que o chamou de Romeu, Peri e Cândido. Casaram-se dois dias depois e voaram para Nova Iorque, onde ela tinha que assumir um emprego. Enquanto isso, o rapazinho Manoel foi à biblioteca procurar os livros de Shakespeare, José de Alencar e Voltaire, citados pela esposa do amigo. Ele fez dela sua musa. Queria encontrar uma Patrícia quatro anos mais nova, para namorar, conversando sobre literatura e filosofia. Nunca encontrou.
No ano seguinte ao do casamento do amigo, Epaminondas, o mais velho da turma, perde sua namorada Luana, amiga da Patrícia, porque deu ouvido à falação dos operários. Há mais de três décadas procura por ela. Aos 59 anos, para não se acabar de angústia, brinca, inventando históricas bizarras com fundo de verdade.
Lourival não dá notícias e reaparece vinte e nove anos depois com sua mulher. Epaminondas espera que ela saiba onde ele possa encontrar Luana. Mas a mulher é outra, Adélia, e Lourival não se lembra que se casou com Patrícia e nem que teve com ela um casal de gêmeos. Durante anos, a mulher de que se lembra, com quem teria morado no exterior, seria sua mulher atual, com quem também teve um casal de gêmeos.
À medida que a história é vivida e o passado é esclarecido, percebem que o paradoxo, a absurda expressão “autodisciplina terceirizada”, tanto é real quanto interferiu em seus destinos, levando-os a não ser o que haveriam de ser.
Em 400 páginas de humor, romance, filosofia, resgate de saúde e de relacionamentos, passado e presente se encontram, explicam-se e se resolvem.

Um comentário:

  1. Que surpresa!! Uma correta, gostosa e criativa narração de Wagner Andrade a respeito da história de três jovens que vivem em Belo Horizonte, mas que, de tão universais, poderiam estar em qualquer parte do mundo. Seus sonhos, seus pesadelos, suas aventuras, enfim, suas vidas, ao longo de mais de 50 anos. As famílias, os filhos, a tristeza, a saudade, enfim, todos os sentimentos que sentimos durante o transcorrer de nossas vidas.

    O milagre econômico, a ditadura brasileira, os infindáveis anos 60, os maravilhosos anos 70, de muitas realizações, algumas passagens de grandes autores e muito mais nesta obra de arte nascida em Minas Gerais, mas que percorre o mundo todo pela sua universalidade. A história de modestos, simples, mas criativos garotos mineiros que vivem a vida - e toda uma história!

    Encontrei muita poesia, romance, crítica e criatividade no livro que, de tão moderno e saboroso, torna-se uma ficção romanceada que influenciou diretamente minha vida, após sua leitura. O gosto pela caminhada, o cuidado com a autodisciplina, o valor da família, tudo isso me fez mudar um pouquinho - para melhor, claro!!


    João Batista de Freitas
    Jornalista, escritor, revisor, crítico - e fã incondicional deste maravilhoso Autodisciplina Terceirizada.

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